Já é tradição o orçamento da União contar com uma “ajudinha” de compromissos assumidos em anos anteriores, mas não pagos nos respectivos exercícios. Dessa vez, no entanto, além de lançar ordens bancárias de investimentos nos últimos dias de 2013, o governo compromissou, mas não pagou no ano, passado cerca de R$ 165 bilhões. Se o montante for somado ao estoque de restos a pagar já existente (R$ 76 bilhões) deverá gerar inscrição e reinscrição de restos a pagar de aproximadamente R$ 240,1 bilhões para este ano.
O valor “rolado” para 2014 é recorde e R$ 63,9 bilhões superior ao mesmo ao de 2013, quando os restos a pagar somaram R$ 176,7 bilhões. Os compromissos de anos anteriores que só serão pagos em 2014 formam uma espécie de “orçamento paralelo” para o período, o que é criticado por especialistas.
Assim como aconteceu no ano passado, o governo ainda poderá cancelar empenhos emitidos e não pagos para atenuar o recorde de restos a pagar. Mesmo se isso acontecer, dificilmente o volume de restos a pagar para este exercício será inferior ao valor de 2013.
Não estão incluídos nos cálculos os dispêndios das empresas estatais, dos estados e municípios e da iniciativa privada, que não são contabilizados no sistema de receitas e despesas da União, o Sistema Integrado de Administração Financeira do Governo Federal (Siafi).
A maior parcela dos restos a pagar a serem inscritos e reinscritos em 2014 é do “tipo” não processados (R$ 201,2 bilhões). A situação ocorre quando ao final do ano existe o empenho mas não há, ainda, o reconhecimento da administração pública de que o serviço foi prestado ou de que o bem adquirido foi entregue. Já os restos a pagar processados surgem quando ao fim do exercício há o empenho e também o reconhecimento de que houve a prestação do serviço ou a entrega do bem. Ao fim de 2013, os restos a pagar processados somaram R$ 38,9 bilhões, valor elevado em se considerando que as premissas para o pagamento já estavam, em tese, atendidas.
Os restos a pagar que irão virar de 2013 para 2014 estão distribuído entre diversos tipos de despesas. Além dos R$ 88,1 bilhões estimados para restos a pagar de “investimentos”, existem cerca de R$ 188,2 bilhões de restos a pagar em “outras despesas correntes” e R$ 27,9 bilhões em “inversões financeiras”.
Para Felipe Salto, especialista em finanças públicas da Consultoria Tendências, os restos a pagar são um problema em busca de uma solução. “Quando o valor de restos a pagar é elevado na natureza de despesa de investimentos é até compreensível, já que algumas obras podem extrapolar um ano. Porém, o que notamos é que os restos a pagar de 2013 para 2014 também envolvem despesas de custeio com valores muito altos. Ter um orçamento paralelo dessa magnitude é falta de compromisso com o orçamento produzido para o ano e com o resultado fiscal, que estaria muito pior caso os pagamentos fossem realizados no período correto”, explica Salto.
Os restos a pagar (RAP) são despesas de um exercício fiscal que serão pagas no ano fiscal posterior ao da sua aprovação na Lei Orçamentária Anual. Os RAPs se dividem em dois tipos: processados e não processados, que dependem da fase da execução da despesa.
Quando a despesa pública é liquidada, significa que o serviço que deu origem a esse gasto já foi efetuado e reconhecido pelo ordenador de despesas, faltando, apenas, o desembolso efetivo do dinheiro (pagamento). Essa despesa liquidada, mas ainda não paga, é aquela que dá origem aos Restos a Pagar Processados (RAP processados).
Já no caso de Restos a Pagar Não Processados, a despesa foi planejada, autorizada e empenhada, mas o ordenador de despesas ainda não reconheceu a prestação do serviço ou a execução do investimento. Assim, a despesa não foi liquidada e o empenho passou para o próximo exercício financeiro. Os recursos empenhados em um ano que são transferidos para o exercício fiscal seguinte são chamado de Restos a Pagar Não Processados.
Evolução
Com o volume crescente de restos a pagar – os RAP em valores constantes (atualizados pelo IGP-DI, da FGV), em 2002 representavam cerca de R$ 57,5 bilhões – criou-se o “orçamento” paralelo. A título de exemplo, nos investimentos da União, foram pagos com o orçamento do ano de 2013 cerca de R$ 16,9 bilhões. No entanto, em decorrência dos restos a pagar foram desembolsados R$ 30,4 bilhões.
No PAC, com o orçamento do ano passado a despesa foi de R$ 19,6 bilhões, enquanto os restos a pagar totalizaram R$ 25,1 bilhões.
Para o especialista em finanças públicas, Mansueto Almeida, a elevação dos restos a pagar é preocupante. “Com mais da metade dos investimentos ocorrendo via restos a pagar, ao invés do processo orçamentário contemplar as obras prioritárias para o próximo ano, o governo realiza obras dos anos anteriores. A execução acontece olhando para o passado”, explica.
Segundo Mansueto, esse crescimento foi “planejado”, pois o governo vem flexibilizando a utilização de restos a pagar. “O Decreto 93.872, de 1986, determinava que os restos a pagar não processados deveriam ser liquidados nos dois anos subsequentes. Contudo, em 2007, essa regra deixou de valer para a saúde, a educação e o PAC (que abrange as grandes e importantes obras do governo federal). Ou seja, o esperado era que esse tipo de despesa crescesse”, explica.
De acordo com o economista, a cada ano fica mais difícil realizar medidas para cancelar os restos a pagar, já que o governo acaba refém do que promete aos parlamentares por meio de emendas. “O saldo de restos a pagar cresceu tanto, que o próprio governo tornou inócuo os processos de cancelamentos. É muito difícil cancelar o empenho por conta das promessas feitas aos parlamentares. O governo se vê incapaz de cancelar esses recursos. Desde 2006, a taxa de cancelamento vem caindo”, afirma.
Cidades e Transportes lideram restos a pagar
Os ministérios das Cidades e dos Transportes são os que mais contribuem para a formação total dos restos a pagar para 2014. A estimativa é que o primeiro conte com R$ 15,1 bilhões em compromissos assumidos em anos anteriores neste exercício. Os programas da Pasta mais “beneficiados” pelo estoque de restos a pagar foram “Planejamento Urbano” (R$ 2,6 bilhões), “Urbanização, Regularização Fundiária e Integração de Assentamentos Precários” (R$ 2,3 bilhões) e “Saneamento básico” (R$ 2,1 bilhões).
Já o Ministério dos Transportes deve ter R$ 14,2 bilhões em restos a pagar para desembolsar em 2014. Do total, R$ 10,1 bilhões estão concentrados no programa “Transporte Rodoviário”. Outros R$ 949,3 milhões estão destinados à rubrica “Transporte Ferroviário”.
PAC
O Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), um dos principais propulsores dos investimentos do governo federal, também terá volume significativo de restos a pagar para 2014. Cerca de R$ 69,6 bilhões devem ser inscritos ou reinscritos nessa categoria de pagamento. O valor é superior à própria dotação do programa no ano passado.
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Sobre a Autora
- Vânia Santana
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- Cidadã em busca de um país e um mundo melhor. Oposicionista, Anti comunismo e anti corrupção. A favor da Paz, Democracia, Ordem e Progresso. Voto Distrital Misto e Facultativo, Parlamentarismo e Sustentabilidade. Tudo o que nunca teremos no Brasil com o PT. "Se numa situação de injustiça, você fica neutro, então você escolheu o lado do opressor."
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