terça-feira, 15 de outubro de 2013 | By: Vânia Santana

Saúde sem educação - Charles Mady

Muito tem sido dito, escrito e discutido sobre o problema da saúde em nosso país. Opiniões e ideias das mais variadas origens levaram o assunto a longas discussões, algumas procedentes e outras, nem tanto, muitas vezes beirando um amadorismo intelectual perigoso para a formação de opinião de nossa sociedade. É muito fácil colocar preconceitos na mente de um povo necessitado de certos tipos de providências. Portanto, discussões com as mais variadas fontes devem ser divulgadas pela imprensa, na tentativa de informar, e não querer formar opiniões.

Devemos partir do princípio de que não se conseguirá resolver problemas nesse campo em curto espaço de tempo. A situação tornou-se muito grave pelo descaso, ao longo de décadas, de nossas autoridades, que assumiram e assumem atitudes pontuais e eleitoreiras, que simplesmente servem para demonstrar ao público que algo estaria sendo feito no momento. Não há planos racionais a longo prazo, talvez porque beneficiariam gestões futuras outras que não as atuais, ou por real incompreensão do processo.

Em qualquer setor da sociedade, mas hoje, principalmente na saúde pública, as soluções deverão passar por um projeto educacional que envolva uma profunda reforma em nossos padrões políticos e universitários. Muito se fala de saúde, mas pouco de educação, como se esta não fosse a chave da solução de boa parte dos infortúnios que hoje nos atingem. Seguramente não teremos saúde de qualidade se não tivermos ensino de qualidade. As autoridades preocupam-se muito com a inclusão de alunos nas universidades, mas não demonstram a mesma preocupação em como esses alunos sairão das escolas médicas. Que estrutura de aprendizado esses jovens têm? Qual é o perfil dos alunos de que necessitamos e deveríamos formar?

Não devemos esquecer também o que ocorre no ensino público básico, no qual a evasão de docentes por más condições de trabalho e salários baixos levou o setor a uma situação quase trágica. Transportem essas mesmas dificuldades para as universidades públicas, que são infinitamente mais complexas. Muitas faculdades foram criadas sem a visão de que elas deveriam ser algo mais que prédios imponentes, inaugurados com grande alarde, com belos jardins, equipamentos caríssimos de última geração, em searas de determinados interesses políticos. Esquecem-se do fundamental, que é a formação de um corpo docente em condições de construir um curso que capacite seus alunos a trabalhar nas condições que nossa sociedade necessita e merece. Devemos entender que a qualidade dos recursos humanos é fator fundamental, muito mais importante que belos prédios e equipamentos de última geração.

Visitando algumas delas, observamos que muitos professores frequentam as escolas esporadicamente, morando em outras cidades ou Estados, não tendo, portanto, as mínimas condições de se envolver com as necessidades básicas do corpo discente. São professores "turistas", que dão seu recado pontual e se retiram. E todos os envolvidos com educação sabem que a presença, os diálogos e discussões são fundamentais para que o ensino sedimente na mente desses jovens.

Charles Mady é professor associado da Faculdade de Medicina da USP e membro do conselho diretor do Incor.

Estadão


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