terça-feira, 24 de setembro de 2013 | By: Vânia Santana

De 594 parlamentares em exercício, 190 foram condenados

Mapeamento da ONG Transparência Brasil mostra que praticamente um terço dos deputados e senadores em exercício recebeu sentenças condenatórias da Justiça ou de tribunais de contas


"Condenações confirmam uma avaliação muito negativa da composição do Congresso", diz o diretor executivo da ONG Transparência Brasil, Claudio Weber Abramo (Dida Sampaio/Agência Estado)
Levantamento inédito feito pela ONG Transparência Brasil aponta que 190 dos 594 deputados e senadores em exercício já foram condenados pela Justiça ou tribunais de conta. São 36 parlamentares do PMDB (35% da bancada), 28 do PT (28%), 22 do PSDB (37%), 16 do PR (37%), 14 do PP (32%), 14 do DEM (44%), 12 do PSB (41%), 10 do PDT (32%), 9 do PTB (36%) e 29 das demais siglas.

Sentenças dos tribunais de contas por irregularidades em convênios, contratos e licitações são as mais recorrentes, atingindo 66 parlamentares (11% do Congresso). Em segundo lugar aparecem as condenações da Justiça Eleitoral por irregularidades em contas de campanha, com 57 deputados e senadores encrencados (9,6% do Congresso). Em terceiro estão os atos de improbidade administrativa (como enriquecimento ilícito e dano ao erário), que levaram à condenação de 41 congressistas (6,9% do Congresso), de acordo com dados extraídos do projeto Excelências (http://www.excelencias.org.br/), recém relançado pela ONG, com apoio de VEJA.

Prisões – Para catorze parlamentares em exercício foram emitidas sentenças de prisão. É o caso, no Senado, de Ivo Cassol (PP-RO). Por unanimidade, ele foi condenado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) a quatro anos, oito meses e 26 dias de prisão, em regime semiaberto, por fraude em licitações. O caso foi julgado em agosto de 2013 mas ainda não teve decretado o trânsito em julgado, a partir do que se dá o cumprimento da pena.

Na Câmara, são treze os deputados federais que receberam penas de reclusão, em alguns casos convertida em prestação de serviços e pagamento de multas, conforme o mapeamento da ONG. Anthony Garotinho (PR-RJ), condenado em 2010 a dois anos e meio por formação de quadrilha, teve a pena de prisão substituída por prestação de serviços e suspensão de direitos políticos, recorreu e aguarda tramitação do caso no STF; o deputado Asdrúbal Bentes (PMDB-PA), por prática irregular de cirurgias de esterilização em troca de votos, foi sentenciado em 2011 a três anos em regime aberto e também recorreu (por meio do famigerado embargo infringente); Carlos Roberto (PSDB-SP) foi punido com três anos de prisão e multa, por apropriação indébita e crimes contra o patrimônio, mas, passando de suplente a titular, a decisão foi anulada em 2013, e o caso, remetido ao STF; Celso Jacob (PMDB-RJ), por falsificar documento público e infringir a Lei de Licitações, foi condenado em primeira instância e também recorreu; João Arruda (PMDB-PR), sentenciado por homicídio culposo em acidente de trânsito, teve a pena convertida em indenização e serviço comunitário; Abelardo Camarinha (PSB-SP), por crime de responsabilidade, foi condenado em 2012 a quatro meses de detenção, pena que foi convertida em multa e prescreveu; Dr. Luiz Fernando (PSD-AM) teve a pena de três anos de prisão por estelionato convertida em prestação de serviços e aguarda recurso; Protógenes Queiroz (PCdoB-SP) foi sentenciado em 2010 pela Justiça Federal a três anos e quatro meses de prisão por violação de sigilo funcional e fraude processual, pena substituída por prestação de serviços comunitários e restrições de direitos, e também entrou com recurso; Marco Tebaldi (PSDB-SC) foi condenado em primeira instância a pagamento de multa e prisão, teve a pena substituída por prestação de serviços, recorreu e aguarda a tramitação do caso no STF.

Mensalão – Há ainda o caso dos quatro deputados condenados em 2012 no processo do mensalão: João Paulo Cunha (PT-SP), Valdemar Costa Neto (PR-SP), Pedro Henry (PP-MT) e José Genoino (PT-SP). Os quatro foram condenados, respectivamente, a nove anos e quatro meses, sete anos e dez meses, sete anos e dois meses e seis anos e onze meses de prisão, mas todos aguardam em liberdade o desfecho do processo, adiado indefinidamente desde a admissão dos embargos infringentes. Ao contrário de Cassol, para os mensaleiros foi decidida, além da reclusão, a perda de mandato. Outros oito parlamentares atualmente em exercício também já tiveram sua cassação determinada pela Justiça para algum cargo anteriormente ocupado (prefeito, deputado estadual ou vereador).

Negativo – "Essas condenações confirmam uma avaliação muito negativa da composição do Congresso. É mais um elemento de decepção", diz o diretor executivo da Transparência Brasil, Claudio Weber Abramo. "Mas não surpreendem: mais da metade dos parlamentares tem algum problema na Justiça ou nos tribunais de contas." Conforme o Excelências, citações nas cortes do país alcançam 54,2% dos deputados e 54,3% dos senadores.




Informações da Veja

quinta-feira, 19 de setembro de 2013 | By: Vânia Santana

El Pais - Revisão do mensalão distancia os brasileiros de seus juízes



Com sua decisão de reabrir o julgamento do mensalão , a maior rede de corrupção da história democrática do Brasil, por seis votos a cinco, o Supremo Tribunal Federal abriu a porta para os doze presos que serão beneficiados com o uso do chamado "embargo infringente" que podem pegar menos anos na cadeia e, em alguns casos,  lucrar com regime semi-aberto. A iniciativa do Supremo poderia encorajar um retorno às ruas dos recentes protestos sociais.

A realização de um novo julgamento também vai atrasar o encarceramento de prisioneiros. Prova disso é que o advogado defensor do principal condenado José Dirceu , foi rápido para expressar sua satisfação com a decisão do Supremo e que agora pode pleitear uma redução da sentença inicial, fixada em 10 anos e 11 meses. É mais do que provável que tenha sucesso em seu negócio, já que a nova composição do tribunal superior sugere uma maioria de juízes que defendem uma linha mais branda sobre a dosimetria das penas.

Após a aposentadoria de dois dos 11 membros do Supremo, os novos juízes Roberto Barroso e Teori Zavascki mostraram que já parecia um novo julgamento um processo liquidado,  promovendo a reabertura através do uso de "embargos infringentes". Seu principal argumento era de que as sentenças foram excessivas e que a decisão do tribunal foi influenciada sob muita pressão social que exigiu dureza para com os responsáveis ​​pela maior rede de compra de votos no Congresso descoberta na democracia brasileira. A justificativa legal para os dois juízes debutantes foi que 12 dos 25 presos receberam pelo menos quatro votos a favor de sua absolvição no primeiro julgamento.

Grande parte do público brasileiro surpreendeu-se diante de uma manobra legal que deixa enfraquecido as 44 mil páginas de resumo e sete anos de análise e deliberações. Permanece como questão perturbadora se a justiça é igual para todos no Brasil.

Apenas um ano atrás, o maior operador do mensalão (termo usado para os subornos mensais pagos por vários deputados), Marcos Valério, disse ao Supremo Tribunal Federal de que o presidente Lula da Silva estava ciente do fato de seu partido comprar votos no Congresso com dinheiro de origem duvidosa.

A acusação era suficientemente séria e documentada para que o tribunal tomasse medidas no sentido de apurar esta informação. Não foi o caso. No entanto, esta decisão parece ser destinada a diminuir a importância ao que realmente era uma corrupção brutal montada que se espalhou nas bancadas do Congresso, repartições públicas, escritórios do partido (principalmente o PT) e empresas privadas.

A reabertura do caso, também significa o fim da lua de mel entre a sociedade brasileira, revoltada com tanta corrupção e impunidade, e o Supremo Tribunal Federal. O presidente do STF, Joaquim Barbosa, promoveu no ano passado um julgamento duro contra os responsáveis ​​mensalão, algo que fez muitos brasileiros  recuperarem a confiança em seu mais alto tribunal.

Em um momento de convulsão social e incertezas, haver um novo julgamento representa mais uma razão para que milhões de brasileiros voltem às ruas. Pressionada pelas manifestações em junho passado, a presidente Dilma Rousseff apoiou ativamente tornar o crime mais grave.

Três meses após esses eventos, os brasileiros viram a sua mais alta corte aplicar uma manobra para beneficiar um grupo de políticos corruptos contra quem ficou suficientemente provada a sua responsabilidade e participação no maior escândalo político nas últimas décadas.

Em outubro do próximo ano serão realizadas eleições no Brasil e o impacto que  terá um novo julgamento na campanha eleitoral do PT é incerto.

Texto original: El País


Manobra do STF tenta antecipar prisões de condenados pelo mensalão

BRASÍLIA - A matemática regimental adotada pelo Supremo Tribunal Federal, além da tradição de morosidade na publicação dos acórdãos, adiará para o início de 2014 o novo julgamento de parte das acusações contra 12 dos 25 condenados no processo do mensalão e a execução das penas. Mas uma proposta que deve dividir o plenário e ser a nova polêmica do caso pode servir de atalho para antecipar a prisão dos condenados no caso.

Os ministros Gilmar Mendes e Marco Aurélio Mello defendem a possibilidade de os réus começarem a cumprir as penas pelos crimes que não podem ser contestados nos novos recursos. O regimento do STF define que os réus só podem se valer dos embargos infringentes para contestar condenações impostas por maioria apertada.

Se o tribunal aceitar essa proposta, um condenado como o ex-ministro José Dirceu poderia ser preso já em dezembro para a cumprir a pena de 7 anos e 11 meses por corrupção em regime semiaberto. Enquanto isso, o tribunal decidiria se manteria ou não a pena pelo crime de formação de quadrilha. Confirmada essa condenação, a pena total de Dirceu voltaria a 10 anos e 10 meses e, com isso, ele passaria ao regime fechado.

O desmembramento do trânsito em julgado do processo, cuja possibilidade já foi criticada pelos advogados, atingiria as figuras centrais do esquema: além de Dirceu, o ex-presidente do PT José Genoino, o ex-tesoureiro Delúbio Soares e o empresário Marcos Valério.

Outra proposta já aventada por parte do tribunal seria executar as penas para os réus que não têm direito aos embargos infringentes. Neste caso, 13 dos condenados, quase todos com participação menos importante no esquema, seriam presos mais rapidamente. Esses condenados, porém, podem apresentar novos embargos de declaração, após a publicação do acórdão.

Morosidade. Se as alternativas para acelerar o processo não forem aceitas pelo plenário, o novo julgamento e a prisão dos réus seguramente ficariam para 2014. Todo esse calendário complexo e cheio de alternativas depende da publicação do acórdão dos embargos de declaração. O regimento fixa prazo de 60 dias, mas os atrasos são a regra na Corte. O acórdão do julgamento encerrado no ano passado, por exemplo, levou quatro meses para ser publicado.

Esse prazo será determinante para definir o desenrolar desse calendário. O desafio do novo relator, ministro Luiz Fux, será combinar com os demais ministros a liberação dos votos e a publicação da decisão antes desse prazo. Pelo histórico da Corte e pela divisão do tribunal ao longo do julgamento, dificilmente os apelos serão ouvidos.

Depois de publicado o acórdão, os defensores de 12 dos condenados terão 30 dias para apresentar os embargos infringentes. Os recursos chegarão ao tribunal às vésperas do recesso de fim de ano. Depois disso, o relator encaminhará os recursos para a análise do procurador-geral da República, Rodrigo Janot.

Para acelerar o processo, Janot pode analisar o caso durante o recesso e encaminhar o parecer em janeiro. Nesse cenário, Fux poderia liberar os processos para serem julgados assim que o tribunal retornasse do recesso, em 3 de fevereiro.

Veja o que pode acontecer com cada um dos 12 réus:

João Paulo Cunha. Condenado pelos crimes de corrupção passiva, lavagem de dinheiro e peculato a penas que, somadas, chegam a 9 anos e 4 meses de prisão e pagamento de multa (R$ 370 mil), o petista deve cumprir pena inicialmente em regime fechado. Com o voto do ministro Celso de Mello pelo acolhimento dos embargos infringentes, a pena pelo crime de lavagem de dinheiro, de 3 anos, pode ser revista e, caso seja reduzida, Cunha pode se beneficiar com o cumprimento de pena em regime semiaberto
José Dirceu. O ex-ministro foi condenado a 7 anos e 11 meses por corrupção ativa e 2 anos e 11 meses por formação de quadrilha. As penas, somadas, chegam a 10 anos e 10 meses. O Código Penal Brasileiro impõe ao réu condenado a mais de 8 anos o cumprimento de pelo menos 1/6 da pena em regime fechado. No crime de formação de quadrilha, Dirceu teve quatro votos pela absolvição, o que lhe dá direito a um novo julgamento com a aceitação dos embargos infringentes. Com isso, a pena de 10 anos e 10 meses pode ser reduzida a menos de 8 anos, o que lhe daria o direito de cumpri-la (1/6 dela) em regime semiaberto
José Genoino. O deputado do PT foi condenado a 6 anos e 11 meses por corrupção ativa e formação de quadrilha. Isso impõe a ele o dever de cumprir a pena em regime semiaberto. Mas, no crime de formação de quadrilha, Genoino foi condenado por maioria 'fraca' (quatro ministros votaram pela sua absolvição), o que lhe dá direito um novo julgamento com a aceitação dos embargos infringentes. Caso a pena por formação de quadrilha seja revista de forma que a soma total das condenações seja menor que quatro anos, o deputado se livra do regime semiaberto e pode requerer substituição por prestação de serviços comunitários
Delúbio Soares. O ex-tesoureiro do PT foi condenado a um total de 8 anos e 11 meses por dois crimes: corrupção ativa e formação de quadrilha, o que o obriga a cumprir 1/6 da pena em regime fechado. No crime de formação de quadrilha, para o qual foi condenado a 2 anos e 3 meses, quatro dos 11 ministros votaram pela absolvição. Isso lhe dá direito ao embargo infringente, aceito pela maioria dos ministros do STF. Se, num eventual novo julgamento, houver redução de pena para menos de 8 anos, Delúbio se beneficia com o cumprimento de pena em regime semiaberto
Marcos Valério. Apontado como figura central do esquema do mensalão, o publicitário foi condenado por cinco crimes a 40 anos, 4 meses e 6 dias, a maior pena aplicada aos condenados. Ele deverá cumprir 1/6 da pena em regime fechado. No crime de formação de quadrilha, para o qual foi condenado a 2 anos e 11 meses, Valério teve quatro votos a seu favor. Mas mesmo que a pena para este crime seja extinta, a redução do total da pena não será suficiente para livrá-lo da prisão em regime fechado
Ramon Hollerbach. O ex-sócio de Marcos Valério nas empresas SMP&B e DNA Propaganda foi condenado a 29 anos e 7 meses de prisão, que ele deve cumprir (1/6 deste período) em regime fechado. Os crimes atribuídos a ele foram corrupção ativa, peculato, lavagem de dinheiro e evasão de divisas. A condenação por formação de quadrilha, para o qual foi condenado a 2 anos e 3 meses, pode ser revista após a aceitação dos embargos infringentes. Isso não muda o regime (fechado) ao qual ele foi condenado
Breno Fischberg. O ex-sócio da corretora Bônus Banval foi um dos que conseguiram redução de pena. A maioria dos ministros havia entendido que Fischberg deveria ter a pena de 5 anos e 10 meses pelo crime de lavagem de dinheiro reduzida para 3 anos e 6 meses. Dessa forma, ele teve direito a substituir a pena privativa de liberdade por prestação de serviços à comunidade. Inicialmente, ele teria de cumprir a condenação em regime semiaberto, sistema em que a pessoa pode trabalhar durante o dia, mas deve dormir no presídio. Como na fase de julgamento Fischberg foi condenado por maioria 'fraca' (com quatro votos pela absolvição), a pena pode ser revista com a aceitação dos embargos infringentes
João Cláudio Genu. Na fase de julgamento dos embargos de declaração, o STF aceitou os recursos do ex-assessor do PP, condenado a quatro anos por lavagem de dinheiro, e alterou o tipo de pena aplicada a ele: de regime fechado para prestação de serviços comunitários. Como Genu, na fase inicial do julgamento, obteve quatro votos pela absolvição, a pena aplicada a ele pode ser revista com a aceitação dos embargos infringentes pelo STF
Cristiano Paz. Outro sócio de Valério foi condenado a 25 anos, 11 meses e 20 dias por corrupção ativa, lavagem de dinheiro, formação de quadrilha e peculato. A pena por formação de quadrilha (2 anos e 3 meses) pode ser revista. Isso apenas reduziria o tempo ao qual Paz seria condenado a prisão em regime fechado
Kátia Rabello. A presidente do Banco Rural também foi condenada por formação de quadrilha, crime ao qual todos os condenados tiveram quatro votos pela absolvição. Com a aceitação dos embargos infringentes, a pena para este crime (de 2 anos e 3 meses) pode ser revista e a condenação total imposta a ela (de 16 anos e 8 meses, por quatro crimes) seria reduzida, mas não o suficiente para livrá-la de cumprir 1/6 dela em regime fechado
José Roberto Salgado. O ex-diretor do Banco Rural foi condenado a um total de 16 anos e 8 meses de prisão pelos crimes de formação de quadrilha, lavagem de dinheiro, gestão fraudulenta e evasão de divisas. Com a aceitação dos embargos por parte do ministro Celso de Mello, a pena total pode vir a ser reduzida em 2 anos e 3 meses. Isso não muda o regime (fechado) imposto a ele
Simone Vasconcelos. A ex-diretora da SMPB, empresa de Marcos Valério, foi condenada a 12 anos e 7 meses. Poderia solicitar o recurso contra condenação de formação de quadrilha, mas a pena já prescreveu e ela não pode mais pagar pelo crime. De qualquer forma, pode recorrer da decisão agora que os infringentes forem aceitos


Estadão

segunda-feira, 16 de setembro de 2013 | By: Vânia Santana

Descoberto lobby de ONG com Gilberto Carvalho



Foto: Valter Campanato - ABr
A organização criminosa que desviou R$ 18 milhões de um convênio com o Ministério do Trabalho buscou apoio e incentivo do ministro-chefe da Secretaria-Geral da Presidência, Gilberto Carvalho, para tentar obter aditamentos e novos repasses de verbas para o Centro de Atendimento ao Trabalhador (Ceat), ONG que teria se transformado no reduto da quadrilha.
Relatório da Operação Pronto Emprego, da Polícia Federal, deflagrada dia 3 em São Paulo, revela que o ministro era tratado pela quadrilha como seu "interlocutor" na pasta do Trabalho. Interceptações telefônicas mostram que, em maio, o grupo estava preocupado com perda de espaço no ministério e com uma divisão na cúpula da pasta. "Gilberto Carvalho irá resolver isso", diz Jorgette Maria Oliveira, presidente da ONG, em ligação gravada.
Carvalho recebeu em seu gabinete muitas vezes padre Lício de Araújo Vale, a quem a PF atribui papel destacado na quadrilha, "articulador dos constantes aditamentos irregulares junto ao Ministério do Trabalho".

Outros dois personagens centrais da trama foram recebidos por Carvalho - Jorgette e o advogado Alessandro Rodrigues Vieira, diretor jurídico da ONG.
O relatório da PF - 192 páginas com fotos, organogramas e planilhas da evolução patrimonial dos investigados - descreve os movimentos da organização e o assédio sobre o ministro. "É bastante comum a dupla (Vieira e Padre Lício) ir a Brasília para tratar da renovação junto a funcionários de alto escalão do Ministério do Trabalho e da Secretaria-Geral da Presidência da República", diz o documento, à página 82.

A ONG foi criada pela Arquidiocese de São Paulo, em 2002. Depois, desvinculou-se da Cúria e virou Organização da Sociedade Civil de Interesse Público para capacitação de trabalhadores. Em 2008, firmou convênio com o Ministério do Trabalho.

O escoadouro do dinheiro público, diz a PF, se deu por meio de aditamentos. Nessa fase a organização pediu colaboração de Carvalho e corrompeu assessores do Trabalho - Gleide Santos Costa, da Secretaria de Políticas Públicas do ministério, foi preso em flagrante com R$ 30 mil que recebera de Jorgette.

Grampo de 20 de maio, 11h43, pegou Jorgette e Gleide. Ela diz que irá a uma reunião no gabinete de Carvalho. Às 12h42, Jorgette conversa com Alessandro Vieira. Ele conta que se encontrou com o secretário executivo do Trabalho, Paulo Roberto dos Santos - que caiu na Operação Esopo -, e que este pediu a Gleide que providenciasse a renovação do convênio. Vieira diz que "seria melhor ganhar a simpatia do ministro Manoel Dias (Trabalho) por intermédio de Gilberto Carvalho".

Vieira diz que Paulo Roberto seria "o ‘gatilho’ do ex-ministro Carlos Lupi dentro do Ministério do Trabalho". A PF diz que padre Lício é "sacerdote e empresário, sócio do Centro Brasil do Trabalho, que não existe de fato, e recebeu R$ 1,26 milhão do Ceat, recursos desviados por meio de prestação de serviços fictícios".


As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

domingo, 15 de setembro de 2013 | By: Vânia Santana

O Processo pelo avesso

Depois de sessenta sessões, sete anos de pastoreio e 50 mil páginas processuais, a decisão mais importante do mensalão cai no colo do ministro Celso de Mello. A ele caberá o voto de desempate sobre os embargos infringentes, na próxima quarta-feira. É muita pressão sobre um homem só. Cruel sina para o juiz, o único que é obrigado a decidir, mesmo sob pressão: é sim ou não. A alternativa “em cima do muro” é inadmissível para um magistrado. De um lado, parcela expressiva da opinião pública, incluindo-se os principais veículos de comunicação do País, clama pela condenação exemplar de personalidades políticas apontadas nas investigações como responsáveis pela compra de apoio parlamentar pelo governo. De outro, militantes e simpatizantes do partido que está no poder, torcem pelo abrandamento das penas e pelo adiamento do resultado final. O “novato” ministro Barroso lembrou ser função precípua de um julgador decidir de acordo com a sua consciência e o seu convencimento - e não pelo que exige a opinião pública. Na tréplica, Marco Aurélio disse que é preciso sim, ouvir o clamor de quem paga os impostos. Continua válida a sentença comum nos tribunais da Roma Antiga: “O juiz é condenado onde o culpado é absolvido”.

A convicção de Celso de Mello já está formada, conforme ele mesmo disse. No ano passado, ele já havia se pronunciado em favor dos embargos infringentes (“infringir” é desrespeitar, no caso o regulamento do STF). Implica em rejulgamento, com chance de revisão de condenações e a suspensão de penas a serem cumpridas em regime fechado. Pode cair o aumento da pena por formação de quadrilha, por exemplo. Com a pena diminuída é mais rápida a prescrição - a perda do direito do Estado de pretender punir alguém, ultrapassados os prazos processuais. Temos em nosso País algumas jabuticabas, como a “prescrição da pena em concreto”. Se o réu tem mais de 70 anos é quase certo que, mesmo que tenha roubado, não vá para a cadeia. O prazo prescricional é ainda mais curto para os idosos. Nos Estados Unidos, o bilionário Bernard Madoff foi preso em 2009 por fraude que resultou prejuízos a investidores avaliados em US$ 65 bilhões. Em apenas oito meses, Madoff foi denunciado, julgado, condenado e preso. A pena é de 150 anos de cadeia. Mesmo com sua provecta idade está atrás das grades, veste uniforme, come “quentinha” e tem que trabalhar na lavanderia. Em Brasília, o governo do DF foi flagrado fazendo reformas no Centro de Progressão Penitenciária para abrigar presos ilustres. Gastos de R$ 3,3 milhões para dar todo conforto aos condenados do mensalão (inclusive), com celas individuais, banheiro privativo, água quente e pontos de tevê, Internet e ar condicionado.

A grande lição deste triste episódio é a da necessidade de se tornar o processo penal brasileiro eficiente. Isto é possível de se fazer sem violar as garantias constitucionais de direito ao contraditório, ampla defesa e devido processo legal. No mensalão, depois dos embargos infringentes virão os embargos declaratórios sobre “pontos obscuros” e, depois, os embargos dos embargos. Quando vai terminar o processo, ninguém sabe. Fala-se numa agenda a ser cumprida pelo STF, formulada pelo próprio colegiado. Seria ótimo evitar a extinção da punibilidade, pelo menos. O ceticismo do brasileiro com a Justiça é conhecido. Considerada leniente com os ricos e poderosos. Aqueles que acham que cadeia foi feita para pobres, negros e prostitutas terão mais um forte argumento. Estas discussões vão se arrastar pelo ano eleitoral de 2014, o que pode ser desgastante para a candidatura à reeleição de Dilma Rousseff.

Se a eficácia e a eficiência do processo penal brasileiro permanecerem esquecidas, as instituições brasileiras estarão realizando um processo de justiça meramente literário. Durante uma das últimas sessões do STF, a advogada lia na galeria o livro “O processo”, de Franz Kafka. Por certo foi mais proveitosa a leitura do que assistir à tediosa abertura de asas e caudas dos pavões. Kafka narrou a história de um condenado que não sabia dos motivos da sua punição. O Brasil está próximo do avesso da literatura kafkiana - admite-se a culpa dos réus, mas não é possível condená-los.

por Zarcillo Barbosa

Jornal da Cidade