quinta-feira, 4 de abril de 2013 | By: Vânia Santana

Pela desigualdade - por Carlos Alberto Sardenberg



O ponto de partida é o seguinte: as crianças estão com dificuldades para alcançar a plena alfabetização no primeiro ano, ou seja, aos sete anos. Além disso, há um número expressivo de reprovações nesse primeiro ano, justamente por causa do atraso em leitura e redação.

Qual a resposta da autoridade educacional?

É fácil: eliminar a reprovação - todos passam automaticamente - e, sobretudo, fixar como meta oficial que a alfabetização deve se completar no segundo ano, quando a criança estiver fazendo oito anos. Em resumo, dar um período a mais para aprender a ler e escrever.

Não, não se passa no Brasil. Está acontecendo na Costa Rica. Mas, no Brasil, está, sim, em andamento o programa Alfabetização na Idade Certa, sendo esta também definida aos 8 anos.

A Costa Rica é o melhor país da América Central e considerado de bom padrão educacional. De fato, no teste Pisa, aplicado pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico em alunos de 15 anos, de 70 países, a Costa Rica obteve 443 pontos em leitura, ficando na 44ª. posição. Na América Latina, só perde para o Chile, cujos alunos alcançaram um pouco mais, 449 pontos. O Brasil está pior, 412 pontos nesse quesito.

Os cinco primeiros colocados são os alunos de Xangai, Coreia do Sul, Finlândia, Hong Kong e Cingapura, com notas entre 526 e 556. Pois nesses países a idade certa para alfabetização é seis anos. Isso mesmo, dois anos antes das metas de Brasil e Costa Rica. A questão é: quando e por que se precisa de mais tempo?

Na Costa Rica, onde a reforma educacional ainda está em debate, há dois tipos de argumentos, um referente ao calendário escolar, outro propriamente pedagógico.

No calendário: o problema, dizem autoridades, é que há muitos feriados e muitos períodos de férias, de modo que o ano letivo não passa de seis meses. Se as crianças vão menos dias à escola, claro que aprendem menos.

O leitor pode ter pensado: mas não seria o caso de aumentar o número de dias letivos?

Para os políticos, nem pensar. Criaria uma encrenca danada com professores e outros funcionários do sistema.

Já o argumento pedagógico diz que não se pode forçar uma criança de sete anos, que se deve deixá-la seguir segundo suas necessidades e seu próprio ritmo.

Quem acompanha o debate educacional no Brasil já ouviu argumentos semelhantes. Por exemplo: no programa Alfabetização na Idade Certa não foram introduzidos padrões que permitam medir se a criança sabe ou não ler. Seria possível fazer isso, uma medida numérica? Sim, já se faz pelo mundo afora. Em Portugal, por exemplo, no primeiro ano, o aluno deve ler em um texto simples, 55 palavras por minuto; no ano seguinte, 90 e, no terceiro ano, 110.

Simples, objetivo, de fácil avaliação.

Não é só no Brasil, mas em praticamente toda a América Latina esse tipo de avaliação causa até uma certa ojeriza. Entre professores, aqui, é forte a rejeição a avaliações concretas, como, por exemplo, um teste nacional que meça a capacidade dos mestres várias vezes ao longo da carreira. Médicos e advogados também não querem fazer as provas profissionais.

Tudo considerado, ficamos com as metas pouco ambiciosas. Pode-se argumentar que seria, digamos, romântico colocar como meta a alfabetização aos seis anos no Brasil. Se um número expressivo de jovens é classificado como "analfabeto funcional" depois do ensino médio, como querer que todos aprendam a ler e escrever aos seis anos?

Um equívoco, claro. Não há razão alguma para não fixar para os que entram agora na escola as metas mais rigorosas e adequadas aos padrões internacionais.

Há também uma questão política, que tem a ver com o desempenho dos governos: metas mais largas são mais fáceis de atingir e, claro, de propagandear.

Isso reflete uma cultura - a de evitar o problema, escolher o desvio mais fácil e politicamente mais vendável. Se as crianças não estão aprendendo na idade certa, se dá mais tempo a elas, em vez de tentar melhorar o processo de alfabetização. E, avançando, se os alunos das escolas públicas não conseguem entrar nas (ainda) boas universidades públicas, abrem-se cotas para esses alunos, muito mais fácil do que melhorar o ensino médio.

Dizem: o problema é que as universidades públicas estavam sendo ocupadas pelos alunos mais ricos vindos do ensino médio privado. Falso. O problema não está nas boas escolas privadas, está na má qualidade das públicas. Melhorar estas seria a verdadeira política de igualdade.

A propósito: nas boas escolas privadas, as crianças já sabem ler e escrever bem aos seis anos.


O Globo
terça-feira, 2 de abril de 2013 | By: Vânia Santana

Comissão da Verdade não se presta a marketing



Foto: Sergio Lima / folhapress


Consta que a presidente Dilma Rousseff está desgostosa com o trabalho da Comissão da Verdade, criada por ela em 2011 para esclarecer atos de violência cometidos por agentes públicos. Embora, formalmente, o período abrangido pela comissão seja de 1946 a 1988, ano de promulgação da Constituição que restaurou a democracia, o objetivo das investigações é esclarecer casos de torturas, mortes e desaparecimentos ocorridos no regime militar, de 1964 a 1985.

Noticia-se que a presidente deseja resultados concretos que abalem a opinião pública. Teria pedido que a comissão desse prioridade a depoimentos públicos de familiares de vítimas do regime, a fim de criar uma "catarse nacional", para funcionar como vacina contra qualquer tentação futura de uma ação militar autoritária. A presidente Dilma patrocina, assim, mais uma das incompreensões que cercam a Comissão da Verdade. No final do governo Lula, quando ela foi incluída na terceira versão do Plano Nacional de Direitos Humanos, quase houve um curto-circuito com os militares porque se tentou abrir espaço no PNDH-3 para que agentes da repressão política daqueles tempos pudessem ser processados.

Ora, a manobra era uma provocação imatura, pois o Supremo já havia batido o martelo ao decidir que a Lei de Anistia, de 1979, do presidente-general Figueiredo, passara uma borracha sobre a atuação criminosa de todos os combatentes da "guerra suja", de ambos os lados.

Cabe à Comissão da Verdade é esclarecer todos os detalhes do que se passou nos porões da ditadura, o paradeiro de desaparecidos, as circunstâncias daquela "guerra", a fim de atender a parentes das vítimas e à necessidade de preservar fatos para a História, para que sirvam de lição às próximas gerações.

Não é necessária qualquer catarse para vacinar o país contra tentações autoritárias. Talvez a ideia derive de comparações inadequadas entre o que aconteceu no Brasil e em outras ditaduras latino-americanas, naquele período de trevas continentais. Toda ditadura, de direita ou esquerda, é maléfica em si. As dimensões das tragédias políticas entre os países são, porém, diversas. Claro que o assassinato de 10 ou 10 mil cometido por agentes do Estado é odioso do mesmo jeito. Mas é mais fácil haver catarse na investigação de um caso do que no outro. E no Brasil os crimes de agentes do Estado - inaceitáveis, frise-se - chegaram às centenas. Em países vizinhos, aos milhares.

Não se entende, ainda, por que se criar comoção num processo de investigação cujos limites e objetivos foram referendados pelo próprio Supremo, com base numa anistia negociada de maneira ampla entre militares e oposição - muito diferente do que aconteceu em alguns vizinhos latino-americanos. A Comissão da Verdade não pode ser manipulada com fins de marketing ideológico, algo extemporâneo no Brasil de 2013.


O Globo
sexta-feira, 29 de março de 2013 | By: Vânia Santana

Politicamente incorretos, mas não hipócritas.




‘Você nunca será escravo daquilo que não fala’.

Enquanto nas últimas semanas, podemos observar a guerra que se trava no cenário político dos politicamente corretos versus os politicamente incorretos, vamos assistindo uma verdadeira epopéia de discursos de ódio, disseminados pelos que se dizem defensores das minorias. Alguns dizem defender a liberdade de expressão, mas querem reprimir o direito alheio de fazer o mesmo. Tem aqueles que impõem sua opinião e se não encontram apoio, mas rejeição, passam imediatamente a querer usar da força, do grito ou se fazem de vítima. Não convencendo assim, passam a usar da desqualificação. Não da mensagem, mas do mensageiro. Este comportamento está em todo lugar. Inclusive nas redes sociais.

Ao contrário da ditadura, você pode, na Democracia, falar mal até de presidentes.

Mas se emitir qualquer opinião pessoal sobre raças, credos, classes sociais ou gêneros... os democráticos defensores dos direitos humanos (aqueles que deviam abranger todos os cidadãos sem distinção, já que a lei é igual para todos - embora não  trate a todos com igualdade), se voltam à defesa dessa parte agora distinta dos humanos, as chamadas minorias. Preferencialmente, a categoria daqueles que possam por eles servir como soldados subservientes de seu exército particular.  Desde que sirvam a seus objetivos. Pode ser partidário também. E não se enganem, frequentemente, é. Quer um exemplo dessa escolha? Ladrões, pedófilos, traficantes, e até políticos, também são minorias, ou não?

Você pode não concordar, é seu direito, e pode optar por parar de ler o texto aqui. Talvez você  ainda ache que tanto a manifestação para tirar Renan da Presidência do Senado, quanto aquelas vassouras em Brasília, foram mesmo realizadas e pagas com dinheirinho obtido de manifestantes ‘apartidários’.

Fossem todas as pessoas seres pensantes com opinião própria, não haveria sequer os tais ‘formadores de opinião’. Fossem também as pessoas capazes de atitudes cidadãs, sequer haveria necessidade de líderes. Cada um cumpriria o seu papel na sociedade, e os governantes, suas obrigações. E jamais seriam ‘endeusados’ por isso. Muito menos por seres que pagam impostos, e altos, e recebem migalhas em serviços públicos. Traduzindo: pagam todos, cúmplices e/ou indignados, os salários e mordomias a estes que se investem de direitos e poderes em busca de projetos pessoais, graças a esta cumplicidade generosa, ou dos coniventes ou da grande massa que apóia indiferente, os desmandos praticados por vossas excelências.

Voltando aos defensores... Para haver a defesa de algo ou alguém, deve haver ‘ofensa’. A ofensa pode ser física ou pode ser verbal.  Pode ser inclusive gestual. A coisa está tão endêmica, que não precisa ser explícita. Pode não ser direcionada, mas se torna pessoal. As vezes depende de interpretação. Eu acho mesmo é que tem muita gente sofrendo de ‘síndrome do bullying’. Tempos modernos de uma sociedade doente.

Informações distorcidas, inverdades. Mentiras manipuladas, notícias manipuladas, e com isso, pessoas manipuladas. Os inocentes (ou não) úteis usados para se alcançar um objetivo, e creio eu, se estes são os princípios e os meios utilizados, o fim não deve ser nada apreciável e nobre. Por outras vezes, isto acontece para desvio de foco.

As pessoas engolem elefantes, mas se engasgam com uma mosca.

Basta prestar atenção, ao que está acontecendo no Congresso, com relação à CDH. O que ali ocorre, em minha opinião, são discursos de ódio, e não defesa de direitos de minorias. Há uma manipulação explícita entre grupos radicais para atingir seus interesses. Se a mim, Feliciano (embora legitimamente eleito) não me representa, menos ainda o deputado Jean Wyllys, (que só está onde está por votos de legenda, pra quem não sabe) . O deputado BBB só tem demonstrado censura a liberdade de expressão, além de incitar a violência.

Não há desvio do foco? Encerraram-se os protestos da sociedade contra a permanência de Renan, à presidência do Senado. Sem falar da Petrobrás, da inflação galopante, de Rosemary Noronha, dos 39 Ministérios, do aumento de salários e cargos, e da volta dos que não foram nos Ministérios. Da Transposição que não houve, da seca do NE e enchentes e mortes no Rio. E apesar da sociedade ter cobrado o julgamento do mensalão, e a punição de seus participantes, todos continuam livres. Dois deles, José Genoíno e João Paulo Cunha, desfrutam do cargo de deputados, e foram silenciosamente colocados sem nenhum protesto popular, nem de grupos de minorias, nem de artistas, na presidência da CCJ (Comissão de Constituição de Justiça). A Comissão mais importante do Congresso. Seria hilário, se não fosse trágico.

Enquanto os politicamente incorretos lutam pelo direito de expressão, os politicamente corretos, aqueles que não 'discriminam' , se propõem a usar uma linguagem neutra, para não ‘ofender’ ninguém. Para tentar calar os que não acatam suas regras,  desejam impor isso pela regulamentação da mídia.

Podemos ver este exemplo ‘indiscriminatório’ e não ofensivo, no Blog da Dilma, quando da visita da blogueira cubana Yoani Sanches, "Quem está financiando a mega viagem da blogueira rola bosta Yoani Sánchez" e no texto de Cynara Menezes (a musa jornalista dos petistas da esquerda democrática, junto com Nassif e Paulo Henrique Amorim - este último já processado e condenado por racismo), de hoje, cujo título é “o perfeito imbecil politicamente incorreto’. Os títulos já demostram que, realmente, são os politicamente corretos e esquerdistas coerentes e belos exemplos de dignidade humana.




quinta-feira, 28 de março de 2013 | By: Vânia Santana

Declarações e desmentidos - por Celso Ming



Em entrevista aos jornalistas brasileiros em Durban (África do Sul), onde se encontrava para a cúpula dos Brics, a presidente Dilma Rousseff fez declarações sobre a inflação e sobre a estratégia de contra-ataque do governo que trombavam frontalmente com o que vem sendo dito pelo Banco Central.

Foram afirmações feitas horas antes da divulgação do Relatório de Inflação (que sai hoje), documento trimestral pelo qual o Banco Central transmite seu diagnóstico da inflação e diz como pretende controlá-la.

Depois que o conteúdo da entrevista foi conhecido pelo mercado financeiro e que já fazia estragos no mercado futuro de juros, o presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, em nome da presidente Dilma, reafirmou a disposição do Banco Central em combater a alta da inflação com a veemência devida: "Não há tolerância em relação à inflação".

Horas depois, a própria presidente voltou a convocar os jornalistas brasileiros para denunciar a "manipulação da notícia" e deixou claro o que não tinha ficado antes: que, para ela, "o combate à inflação é um valor em si".

Nas declarações que entendeu terem sido manipuladas, Dilma dissera que o aumento da inflação que aí está é produto de choques externos e que seu governo não vai adotar nenhuma política que sacrifique o crescimento econômico e o emprego. Ficou entendido, assim, que o recuo da inflação viria espontaneamente e que a política monetária (política de juros) não deveria ser acionada pelo Banco Central para empurrar a inflação para dentro da meta.

A ênfase dada pela presidente Dilma às causas externas da inflação não explica por que esses choques de oferta de alimentos, gerados pela seca que derrubou as safras dos Estados Unidos no ano passado, só provocaram toda essa inflação no Brasil - e não também em outros países emergentes.

De todo modo, não é esse o diagnóstico do Banco Central. Em seus documentos (Relatório de Inflação e atas do Copom) vem denunciando mais causas internas do que externas para a inflação, que atualmente ultrapassa o nível dos 6% em 12 meses.

São elas fundamentalmente três: (1) descompasso entre uma "demanda robusta" e uma oferta fraca, ou, em outras palavras, incapacidade da produção interna de dar conta do forte consumo; (2) política de gastos públicos frouxa demais; e (3) mercado de trabalho excessivamente aquecido.

O Banco Central tem também repisado que não há incompatibilidade entre as políticas de combate à inflação e a criação de condições para o crescimento econômico - como pareceu sugerir a presidente Dilma Rousseff. Tem enfatizado o contrário. No parágrafo 32 da última Ata do Copom, por exemplo, deixou dito que "taxas de inflação elevadas reduzem o potencial de crescimento da economia, bem como de empregos e de renda".

As declarações estão gravadas e aparentemente a presidente disse o que não deveria ter dito. Talvez a questão mais relevante para o acontecido seja o fato de que, apesar das explicações e dos desmentidos, Dilma tem dado motivos para que os agentes econômicos tendam a achá-la mais tolerante com a inflação do que admite ser. E, também, de que não gosta de que a política de juros seja usada para enquadrar a inflação dentro da meta.


Celso Ming - O Estado de S.Paulo

domingo, 24 de março de 2013 | By: Vânia Santana

Rápidos no gatilho - por Dora Kramer





A desfaçatez anda de tal forma despudorada que a Câmara nem esperou esfriarem os corpos dos recentemente extintos dois salários extras por ano, para torná-los cadáveres insepultos na forma de aumento de verbas compensatórias à “perda” de suas excelências.

Há dois tipos de contas a serem feitas: uma é numérica, a outra política. A Câmara fica devendo nas duas.

Com a primeira promete uma economia de R$ 27,4 milhões deixando de pagar os salários adicionais, mas vai gastar quase tudo (R$ 21 milhões) só com o reajuste daquela cota para despesas extraordinárias que não raro é usada para gastos ordinários – no sentido pejorativo do termo.

Isso sem falar na criação de novos cargos (59), duas novas estruturas (Corregedoria Autônoma e Centro de Estudos e Debates Estratégicos da Casa). A título de verniz, criou-se um tipo de ponto para controlar melhor o pagamento de horas extras dos funcionários do Legislativo.

Positivo? Sem dúvida, mas risível e até provocativo o aperto em face do afrouxamento na rubrica das benesses aos parlamentares que, segundo pesquisa recente, estão em segundo lugar entre os mais caros do mundo.

Mas dizíamos que há uma conta numérica e outra política. Nesta também o saldo é negativo. Confirmou-se a necessidade de adotar parcimônia em elogios quando o Congresso se curva à necessidade de dar cabo a exorbitâncias. Viu-se pela rapidez no gatilho para anular a economia e criação de duas esquisitices.

“Corregedoria Autônoma”? Alto lá: há uma corregedoria em funcionamento e que, pelo visto, foi posta sob desconfiança de atuar sem a necessária independência.

“Centro de Estudos e Debates Estratégicos da Casa”? Espera aí: não seria o Parlamento já um centro de estudos e debates? Não são o estudo e o debate funções do Legislativo junto coma prerrogativa de legislar e fiscalizar?

Ou bem estão sendo criadas instâncias inúteis, ao molde de sinecuras, ou mal estão sendo criadas instâncias com sobreposições de funções. Ao molde de sinecuras.